Qualquer pessoa que acompanhe a evolução
demográfica da população brasileira, que tenha algum conhecimento em contas
públicas e em cálculo atuarial não teria dúvidas sobre a necessidade da reforma
da Previdência. Se nada fosse feito, o déficit continuaria
crescendo a taxas mais elevadas, acabando com qualquer possibilidade de o
Estado brasileiro executar políticas públicas, inclusive aquelas que envolvam
distribuição de renda.
Mas a pergunta que ficou depois da
aprovação da atual proposta em primeiro turno na Câmara: é que reforma é esta e
qual seu efeito no longo prazo? Em outras palavras, ela é justa e eficiente?
Resolvemos definitivamente o problema do déficit da Previdência?
Em primeiro lugar, as críticas sobre
injustiças podem ser parcialmente aceitas na medida em que determinados grupos
e setores da sociedade têm mantido ao menos parte de suas vantagens quando
comparados aos demais. São exemplos disso a retirada do setor rural da reforma,
a redução da idade mínima para mulheres e alguns benefícios mantidos para
policiais federais e do Distrito Federal, além, obviamente, da forma como está
apresentada a proposta para os militares.
Em segundo lugar, o jabuti político do
aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para os grandes
bancos só introduz distorções e ineficiências que serão pagas por toda
sociedade. Em um ambiente de elevada concentração bancária e falta de
concorrência, o aumento da alíquota será facilmente repassada via elevação de
tarifas e de taxa de juros. E quem mais necessita de crédito são, em geral, os
mais pobres e as empresas que geram empregos. Ademais, ainda não está claro
como a CSLL será tratada na reforma tributária, podendo implicar perda de
recursos no futuro para a Previdência.
Em terceiro, a retirada de uma espécie de
gatilho automático para a mudança na expectativa de sobrevida nos obrigará em
um curto espaço revisar a idade mínima para a aposentadoria, uma vez que os
dados demográficos indicam que felizmente as pessoas viverão cada vez mais no
Brasil. O problema é que o retorno a essa discussão implicará mais um desgaste
político e econômico para o país.
Em quarto, a não inclusão de estados e
municípios é o que há de mais preocupante no texto aprovado, uma vez que o
maior dos problemas do déficit público brasileiro está exatamente nesses
entes federativos. A ausência de solução para esta questão certamente fará com
que eles recorram em breve ao governo federal em busca de recursos,
contaminando todo o esforço da reforma da Previdência atualmente encaminhada no
Congresso.
Diante dos aspectos aqui apontados, parece
inevitável voltarmos ao tema já na próxima década, a não ser que haja um
aperfeiçoamento no Senado. De toda forma, o primeiro passo foi dado ao
reconhecermos o problema e propormos ao menos mudanças emergenciais.
“Texto publicado originalmente no portal UOL em 12/7/2019.”
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