Nesta última terça-feira (16) o ministro Dias
Toffoli suspendeu em caráter liminar todas as investigações que foram baseadas
em dados fiscais repassados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras
(Coaf) e pela Receita Federal ao Ministério Público sem autorização judicial.
Não pretendo aqui questionar se estavam presentes os requisitos para a
concessão de “medida cautelar”, mas sim avaliar os efeitos da manutenção desta
decisão pelo plenário do Supremo Tribunal Federal.
A restrição a que a Receita Federal e
principalmente o Coaf informem movimentações suspeitas às autoridades de
persecução criminal (Ministério Público, por exemplo) dificultará sobremaneira
o combate aos crimes de sonegação fiscal e lavagem de dinheiro. Isto porque
muitas vezes as autoridades de investigação não têm nenhum indício de quais os
crimes podem estar sendo praticados. E esta limitação só é corrigida quando a
Receita ou o Coaf identificam potencias movimentações “estranhas” e as
comunicam para os órgãos de investigação. Exigir que essa comunicação seja
realizada mediante solicitação judicial poderá burocratizar absurdamente o
processo, além de atravancar o já lento e ineficiente Judiciário nacional.
Neste contexto, haverá um incentivo para a
atuação de potenciais infratores, uma vez que elevará os ganhos líquidos
associados às práticas criminosas aqui tratadas. Em particular, há que se
realçar que o crime de lavagem de dinheiro está associado a vários outros
crimes antecedentes, tais como corrupção, tráfico de drogas, terrorismos,
sequestro, colarinho branco e à própria sonegação.
Assim, a manutenção da decisão do ministro
Toffoli, ao dificultar as investigações, acaba estimulando os crimes com tais
características, o que implicará o comprometimento do bom funcionamento da
economia brasileira. O crime de sonegação, por exemplo, distorce as condições
de competição nos mercados, desestimulando investimento de empresas sérias e
produtivas. O de corrupção, além de ter impacto negativo sobre as contas
públicas, também pode afetar as condições de concorrência. Os de tráfico de
drogas, terrorismo e sequestro exigem mais alocação de recursos públicos para
combatê-los. E assim por diante.
Não por outra razão que, desde a década de
90, a maioria dos países tem aperfeiçoado a legislação com o intuito de
combater mais fortemente os crimes de sonegação e de lavagem de dinheiro. No
Brasil, até então, a legislação e a própria atuação das autoridades têm
caminhado em linha com experiência internacional. Mais do que isso, o país tem
procurado seguir à risca os 40 pilares do Grupo de Ação Financeira contra a
Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Gafi/FATF), organização
intergovernamental cujo propósito é desenvolver e promover políticas nacionais
e internacionais de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do
terrorismo.
Reverter a prática adotada atualmente
implicará não só reduzir a eficiência do nosso sistema de combate à lavagem de
dinheiro, com graves efeitos sobre nossa economia, mas também atropelar acordos
internacionais firmados de adoção de melhores práticas. E se isso ocorrer,
certamente não conseguiremos manter o mesmo nível de cooperação internacional
que tem nos permitido recuperar tantos recursos no exterior, frutos de crimes
aqui praticados.
A esperança é que o ministro Toffoli
repense os efeitos de sua medida liminar ou que o plenário do Supremo tome
rapidamente uma decisão definitiva sobre o assunto, observando as melhores
práticas internacionais e usando um pouco da lógica contida na Análise
Econômica do Direito.
“Texto publicado originalmente no portal UOL em 19/7/2019.”
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