terça-feira, 16 de julho de 2019

BNDES PRECISA DE OUTRAS COISAS, E NÃO DEBATE ESQUIZOFRÊNICO DE CAIXA-PRETA

Nesta semana Gustavo Montezano assume o cargo de novo presidente do BNDES em meio a um debate esquizofrênico sobre a suposta falta de transparência e os prejuízos incorridos pelo banco durante o governo PT.

É claro que transparência é o mínimo que se espera quando tratamos de “recurso público”, principalmente quando envolve também dinheiro do trabalhador brasileiro. E nada impede que investigações internas e outras eventualmente realizadas por CPIs ou pelo Ministério Público Federal, desde que devidamente motivadas e apoiadas em medidas judiciais, possam esclarecer eventuais dúvidas sobre a lisura das operações realizadas pela instituição. Mas este não deveria ser o foco do novo presidente.

A insistência na discussão sobre a lucratividade do BNDES também não contribui para o debate, uma vez que os dados agregados disponíveis dizem muito pouco sobre operações específicas. Ademais, a correta análise de eficiência de um banco público envolve muito mais do que aspectos financeiros e deve englobar também critérios como a contribuição ao desenvolvimento econômico e tecnológico, questões socioambientais e até mesmo institucionais. Ou seja, o impacto sobre o bem-estar agregado da sociedade é o que importa.

O mais produtivo seria investigar os efeitos das diretrizes econômicas passados sobre o conjunto dos aspectos aqui citados, o que nos levaria a reconhecer os efeitos nocivos da “política de campeões nacionais” sobre as estruturas dos mercados e consequentemente sobre o consumidor nacional, além do impacto negativo do aumento da dívida do banco com o Tesouro Nacional sobre variáveis macroeconômicas.

Com base neste diagnóstico, e aplicando o princípio econômico que sugere que bancos públicos de desenvolvimento devam atuar fundamentalmente para corrigir falhas de mercado, poderíamos prescrever missões mais adequadas para o BNDES. 

A primeira delas seria direcionar recursos para áreas nas quais os bancos privados não tenham interesse ou para casos em que o custo da operação financeira com as instituições privadas seja excessivamente elevado (dado o risco incorrido), mas cujo resultado para a sociedade seja muito positivo e, portanto, desejável. São exemplos de situações como esses projetos que envolvam inovação ou responsabilidade socioambiental e determinados investimentos em infraestrutura que tenham retorno muito incerto, mas que elevem a produtividade da economia ou ampliem o bem-estar social.

A segunda implicaria reduzir o tamanho do banco, devolvendo ao longo do tempo os empréstimos realizados com o Tesouro Nacional. Isso permitiria reduzir a dívida pública, ampliar a oferta de dinheiro no mercado, com implicações, inclusive, sobre as taxas de juros praticadas.

Subsidiariamente, dada o corpo técnico qualificado da instituição, caberia também ao BNDES auxiliar na modelagem do processo de desestatização que, se implementado, poderá elevar sobremaneira a produtividade da economia brasileira e auxiliar a reduzir nossa dívida pública.

O grande problema para Bolsonaro é que, se o novo presidente do BNDES se concentrar no que é realmente relevante, apenas repetirá o que Joaquim Levy vinha fazendo.

“Texto publicado originalmente no portal UOL em 16/7/2019.”


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