O candidato Sergio Massa tem se mostrado um total desastre na condução da política econômica
Tenho visto muita gente escrevendo que o processo
eleitoral na Argentina repetiu o padrão de polarização recente
observado na América Latina, cujo melhor exemplo seria o caso brasileiro.
Aliás, vi também jornalista e articulista comparando o candidato
Milei ao próprio Bolsonaro
e justificando que o melhor para o Brasil seria a vitória do
candidato governista Sergio Massa
.
A meu ver, tais comparações pouco agregam e não tocam no
âmago da questão, qual seja, a razão de estarmos criando um padrão de levarmos
para o segundo turno
posições extremas, deixando de discutir os reais problemas econômicos
vivenciados na América Latina.
Se tomarmos o caso argentino, perceberemos que o discurso
de Javier Milei
é pouco crível de ser levado à frente. E isso não só porque fala em dolarizar
a economia ou, na “melhor
tradição” libertária, acabar com o Banco Central
. Na realidade, a grande dificuldade que enfrentará será reduzir os gastos
públicos para algo em torno de 15% do PIB argentino, conforme prometido, em um
país com aproximadamente 40% da população que depende do Estado.
Claro que ele levanta contrapartidas que são bem-vindas,
como simplificação tributária, modernização das leis trabalhistas,
privatizações e reformas no setor de energia e agropecuário. Mas isso são
medidas estruturais que levam tempo e que muito provavelmente não conseguiriam
compensar os efeitos da redução drástica dos gastos públicos por ele proposta.
Por outro lado, Sergio Massa,
o candidato da situação, é o atual Ministro da Fazenda e tem se mostrado um
total desastre na condução da política econômica no
“melhor estilo” Kirchneristas/Peronista. E, para piorar, no desespero de tentar
não perder as eleições, Massa resolveu adotar um conjunto de medidas populistas
(denominado “PlanPlatita” pelos argentinos) que têm acabado de vez com as
finanças públicas do país.
Em realidade, tais medidas não passam de uma compra de
votos de maneira descarada envolvendo desonerações e distribuição de dinheiro
para uma larga gama da sociedade argentina,
principalmente para aqueles 40% que já se encontram abaixo da linha da
pobreza.
Fato é que essa decisão populista, associada a uma
campanha política que propaga o medo com relação ao que Mileipode fazer,
permitiu a Massa ir para
o segundo turno em primeiro lugar. E pelos números das pesquisas
recentes, o candidato da situação deverá se eleger e ter que lidar com sua
própria herança: uma economia que deve chegar ao final do ano com uma inflação
em torno de 170% e com uma recessão gravíssima, derivados, em última instância,
do desajuste das contas públicas.
E o problema disso é que nada em sua proposta de governo
indica qualquer tentativa de correção consistente de rumo. Ao contrário, é um
conjunto de intenções de mais do mesmo, que atende sua base eleitoral calcada
em funcionários públicos e dependentes do Estado. E é neste ponto que mora todo
o problema.
A Argentina
caiu de vez em uma armadilha típica de países que não conseguem entender duas
coisas. A primeira é que todo gasto público deve ter como contrapartida alguma
fonte de receitas, pois, do contrário, o resultado será uma trajetória de
elevação de déficit e dívida pública, culminando no que os economistas
denominam estagflação (inflação com estagnação econômica).
A segunda coisa é entender que, mesmo que a correção seja
realizada com elevação de impostos, a tributação em excesso acaba fazendo com
que o país gere menos renda do que poderia, empobrecendo a todos. E isso é tão
mais verdade quanto mais ineficientes forem os gastos públicos. E neste aspecto
específico, tanto Argentina
como Brasil se igualam.
Em realidade, esse círculo vicioso de descontrole de
gastos públicos, que gera como contrapartida desemprego e empobrecimento de uma
boa parte da população, é um caminho fértil para criar uma espécie de
“dependência química estatal de eleitores”, que passam a acreditar e votar em
todo tipo de candidato populista.
E isso acaba acontecendo porque muitos deles, inclusive,
têm medo do que viria com a mudança do paradigma de distribuição de benesses
estatais. E é neste raciocínio que Massa também tem se apoiado. Claro que
alguém poderia dizer que, dada a gravidade da situação, ele seria obrigado a
enfrentar a dura realidade do país e adotar ao menos algumas medidas
corretivas.
O problema é que mesmo para isso teria que mudar sua base
de apoio no Congresso, uma vez que a atual nunca permitiria uma guinada
da política
econômica desse tipo. Ou seja, Massa criou uma armadilha para si mesmo e para a
própria Argentina.
Nesse sentido, se o melhor para o Brasil é ver o nosso
terceiro maior parceiro comercial voltar a crescer, ainda acho melhor torcer
para a vitória de
Milei, com todas as suas falas bizarras, inclusive sobre o Mercosul.
Isso porque parte de suas propostas, além de caminhar na direção correta, estão
menos distantes das ideias da maioria do Congresso argentino atual.
Ou seja, é mais fácil para Milei ter um choque de
realidade do que o próprio Massa; mesmo porque implementar apenas parte de suas
propostas (como, por exemplo, privatizações) na situação atual da Argentina,
certamente, representará um enorme avanço no meio de tanto caos econômico, além
um imenso ganho político futuro.
“Texto publicado originalmente no portal IG em 28/10/2023.”
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