Formas de o Estado atuar podem influenciar positiva ou negativamente as expectativas futuras e efetivamente o rumo da economia no país
Início minha coluna no iG
fazendo um convite à reflexão sobre quais expectativas deveríamos formar
sobre o futuro do país com base na redução da
taxa básica de juros (Selic) em 0,5 pontos percentuais . Meu foco
aqui não é entender os efeitos de
curto prazo deste processo, mas, sim, questionar se isso será
condição suficiente para que voltemos a crescer de maneira consistente.
Devemos lembrar que a política monetária é somente um dos
alicerces que sustentam a ação do Estado sobre o domínio econômico e tem por
função precípua auxiliar no controle da
inflação, algo que o Banco Central do Brasil tem feito muito bem (e
melhor do que a grande maioria dos outros bancos centrais pelo mundo) nos
últimos anos, em que pese as pressões de toda ordem que sofreu.
A questão, entretanto, é que existem outras formas de o
Estado atuar que podem influenciar positiva ou negativamente as expectativas
futuras e efetivamente o rumo da economia no país. E uma das principais delas
diz respeito à questão fiscal e ao gasto público, um dos maiores problemas
enfrentados pelo país e que até o momento não foi equacionado.
Em que pese termos no Congresso hoje uma proposta de
controle das contas públicas para substituir a “Regra do Teto dos Gastos” até
então vigente, o que está em debate é algo que já assume elevações de despesas
futuras contratadas, com base em crescimento de receitas esperadas incertas e
com um piso para gastos públicos com investimentos, mesmo quando a economia não
andar bem.
Na verdade, essa proposta, que ainda pode passar por
alterações no Congresso, é mais uma construção mais política do que técnica e
certamente exigirá aumento de arrecadação tributária no futuro para fazer
frente às necessidades de financiamento do setor público.
E, neste mesmo capítulo, temos ainda no Congresso a
discussão sobre a sugerida “Reforma Tributária” que, até o momento, mostrou-se
apenas como uma unificação de impostos sobre venda e bens e serviços e cuja
pressão de lobbies de determinados grupos da sociedade exigirá uma elevação
substancial de alíquotas e que terá forte impacto, principalmente, sobre
aqueles que não terão crédito tributário a compensar.
Mais recentemente, iniciou-se uma discussão sobre uma
possível Reforma Administrativa, algo de suma importância para a melhoria da
eficiência do setor público e que, certamente, terá impacto sobre a
produtividade do setor privado. Esta é, de longe, uma questão não trivial e
deve ser tratada de forma técnica, distante de interesses corporativos e,
mesmo, ideológicos.
Essas discussões têm impacto direto sobre as expectativas
dos empresários, responsáveis por realizar investimentos de longo prazo, motor
do crescimento econômico e da ampliação do nível de emprego na sociedade. Esses
agentes (os empresários) estão acostumados a tomar riscos e estão dispostos a
fazê-lo, desde que consigam quantificá-los e precificá-los adequadamente.
O problema maior, entretanto, é que quando caímos em um
ambiente de incerteza (sem qualquer ideia do que virá pela frente), torna-se
impossível qualquer previsão minimamente confiável. Nessas situações, os
empresários preferem “brincar de estátua” e não investem, postergando decisões
estratégicas. E é bem possível que seja essa a maior preocupação da equipe
econômica atual.
De fato, essa agenda de crescimento econômico virtuoso e
contínuo é muito mais longa e certamente passa pela capacidade de o Estado
criar expectativas favoráveis para os agentes econômicos. Por exemplo, garantir
um ambiente de negócio justo e estável, respeitando contratos e regras
pré-definidas (sejam elas regulatórias, legais, etc.), também faz parte dessa
equação, minimizando riscos e reduzindo o custo para o empresário e para a
sociedade.
E isso sem falar nas funções clássicas que o Estado tem,
que envolvem investimento em educação, saúde e segurança pública, e cujo
resultado se reflete não apenas no bem-estar dos cidadãos, mas, também, sobre a
própria produtividade dos trabalhadores em geral (tornando-se mais um fator de
atratividade de investimento privado).
A verdade é que a agenda econômica que devemos enfrentar é
muito maior do que a simples discussão sobre a taxa de juros vigente, mesmo
porque ela é muito mais consequência do que causa.
Mais que isso, os pontos aqui levantados devem ir muito
além de disputas políticas partidárias e ideológicas e, se não forem
adequadamente endereçados nos próximos anos, consolidar-nos-ão como o eterno
país do “voo de galinha” sugerido pelo economista Edmar Bacha na década de 70
como Belíndia (país com impostos de primeiro mundo e com a realidade social de
terceiro).
“Texto publicado originalmente no portal IG em 8/8/2023.”
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